sábado, 30 de junho de 2007

Faz De Conta Que Tem Sol Lá Fora": longa jornada noite adentro
por Maurício Alcântara"Faz De Conta Que Tem Sol Lá Fora" é um dos Quatro Textos para um Teatro Veloz que o ator, diretor, dramaturgo e compositor de boleros de secretária eletrônica Ivam Cabral publicou no ano passado. Uma história intimista, de um casal solitário que se encontra por acaso em uma noite chuvosa de São Paulo, que nos faz pensar no quanto um espetáculo não precisa de grandes altos e baixos: muitas vezes a simplicidade e um pouco de lirismo são mais que suficientes.Em cartaz no Espaço dos Satyros, a montagem dirigida por Aline Meyer tem no elenco Nilton Bicudo e Jerusa Franco, dois jovens atores com uma energia que transparece em seus olhares. Jerusa traz um sorriso melancólico do início ao fim do espetáculo, com gestos afobados e desajeitados como os de uma adolescente. O figurino ajuda a ter esta percepção, mas o texto não a deixa nos enganar: sua personagem está beirando os trinta. Já o personagem de Nilton demonstra mais o peso da solidão da forma como imaginamos: é mais quieto, não sabe o que dizer, não sabe o que fazer.Esta mesma energia que dá vida aos personagens também acaba tornando o espetáculo literalmente veloz: senti falta de pausas, dos silêncios incômodos que o texto incita (ao menos a quem o lê), e sobretudo de vê-los aproveitando a oportunidade de saborear os momentos de quebra e os leves toques de humor, pequenas sutilezas que fazem diferença.A cenografia recria um pequeno apartamento com quatro cortinas transparentes que nos incitam a imaginar as paredes e janelas, e o mundo chuvoso e escuro por trás de cada janela. E eu também teria preferido imaginar o fogo, a chaleira e o rádio que ali estavam, como uma continuação do exercício de fazer de conta que até mesmo o título incita. Teria combinado melhor com a idéia das cortinas do que por exemplo o fogo cenográfico utilizado, forçadamente falso.E mais uma vez fecho com um parágrafo dedicado à platéia. Naquela sessão de sábado, logo na primeira cena, bastou Nilton pisar no apartamento de Jerusa para que meia dúzia de pessoas atrás de mim dispararem suas primeiras gargalhadas. Alguém se esqueceu de avisá-las de que a peça não era uma comédia, e pior: ao longo dos 50 minutos de encenação elas não se tocaram disso. Ficaram a peça toda buscando no riso sua zona de conforto, em um texto que o que definitivamente não existe é uma zona de conforto.Fonte: www.bacante.com.br

segunda-feira, 18 de junho de 2007


Solidão Marcelo Rubens Paiva
Neuras de um solitário: falar sozinho, nunca desligar o computador, não comer comida na panela, mas preparar uma bandeja caprichada e comer em frente da tevê, despedindo-se do William Bonner, fazer a cama de manhã, mesmo que só ele durma nela à noite, fazer a barba e se arrumar, mesmo que a única pessoa que ele cumprimentará será o porteiro, e ouvir Billie Holiday no talo. Pode reparar, todo solitário ouve Billie Holiday. No talo.Armadilhas para se combater a solidão: deixar a tevê ligada num cômodo, conectar-se ao MSN, comprar uma luneta, morar perto de um café ou padaria ou posto de gasolina com loja de conveniência 24 horas, alugar temporadas inteiras de um sitcom e assisti-las sem parar, tomando sorvete do copo, e sair, ir ao cinema e teatro, nunca a um botequim, em que todos se divertem e têm amigos, o que além de aumentar a solidão, lhe dará a fama.Não conheço um paulista que tenha se ofendido com a provocação de Nelson Rodrigues, 'a pior solidão é a companhia de um paulista'. Atrás da expressão carrancuda, fechada, que aparenta pressa e mau humor (pura defesa), há uma figura simples, que gosta de interagir, prestativa, quase um bobo e que sorri quando se caem as máscaras. Nós, paulistanos, nunca deixamos de lado aquele jeito provinciano de sorrir à toa. Somos todos meio ingênuos, quase óbvios, quase inocentes.A companhia de um paulista da zona sul será acompanhada de um truta, ou de um 'chegado', porque mano que é mano anda em dupla. Não falarão gírias, mas dialeto. O tema será sempre o trânsito da M'Boi Mirim, a desigualdade social, a violência policial e as tretas com os manos de outra quebrada. E haverá no ar a utopia: 'O dia que os manos cruzarem a ponte...' Uma referência à Ponte João Dias, fronteira da injustiça social. Já a companhia de um paulista da zona leste vem com um sotaque italiano, belo, e uma fome de carboidrato. Tem muita faculdade por lá. Uma via expressa insana, a Radial. E, agora, uma classe média se enriquecendo. Bairros sem teatros, livrarias, e vida cultural de shopping. Como a zona norte.No fundo, a frase do Nelson Rodrigues é divertida, mas imprecisa. Porque a companhia de um paulista é imprevisível. Já a solidão de um carioca é mais triste do que a de um paulista. Não se imagina que um sujeito daquela cidade deslumbrante, em que as pessoas são informais, espontâneas e divertidas, possa sofrer de solidão. Triste não é só viver na solidão, mas saber que ninguém pode viver de ilusão (Tom Jobim). O paulistano não tem ilusões: é difícil viver na cidade, e a solidão é apenas mais um problema a ser resolvido.A solidão é um dos temas do filme Não por Acaso, lançamento imperdível da Fox e O2. Dois paulistanos, Pedro (Rodrigo Santoro) e Ênio (Leo Medeiros), como todo paulistano, vivem para o trabalho. O primeiro manufatura mesas de sinuca com uma precisão e acabamento que o destacam dos demais fabricantes, e conhece os truques do jogo, como as diferentes maneiras de se bater na bola branca, para determinar onde ela irá parar. O segundo é um engenheiro que controla o tráfego da cidade, dá ordem ao caótico trânsito a partir de uma sala de controle com monitores ligados a câmeras espalhadas por ruas e avenidas, anuncia emergências e abre e fecha os faróis, para o trânsito fluir. Mas um imprevisto, o mesmo atropelamento, muda completamente suas vidas metódicas, regradas. Não é por acaso que o longa de Philippe Barcinski se chama Não por Acaso. Porque o acaso nem sempre é por acaso. Causa uma transformação inesperada e arma encontros que modificam um estado inerte de solidão.Barcinski mostra uma São Paulo lotada mas deserta, se é que você me entende. Cada cidadão anda anônimo no seu carro, oculto pela pressa ou insufilm nos vidros, ou observa o mundo através de uma das janelas do seu condomínio. E a área de lazer que resta a um dos personagens é o Minhocão, que aos domingos fecha para os carros. Se um carioca assistir a esse filme, entenderá por que somos tão diferentes.Faz de Conta Que Tem Sol lá fora é a peça de Ivan Cabral, com Jerusa Franco e Nilton Bicudo (direção de Aline Meyer), no Satyros 1, que mostra como dois paulistanos, que moram no mesmo edifício e nunca se falaram, fazem para aplacar a solidão, observando o mundo pelas janelas, ouvindo repetidamente a mesma música. Ela deixa a porta do seu apê aberta, com medo da solidão. Ele um dia resolve entrar. Fingem que faz sol, quando na verdade lá fora tudo é tão assustador quanto dentro.O que mais aflige um solitário é imaginar que a cidade inteira se diverte, e ele, não, que todos têm alguém, e ele está só, que a paz está na vida familiar e na turma de amigos, e que ele, o solitário, jamais experimentará a sensação confortável de ter com quem desabafar, além do porteiro.O que aflige um solitário é imaginar que faz sol lá fora, e o frio encontrou a sua alma para se instalar. O que aflige um solitário paulistano é que tem alguma coisa acontecendo, e ele está perdendo. É daqueles que precisam dar cinco telefonemas e trocar e-mails com alguém que também não está fazendo nada, ou também sofre de amor, ou também pegou aquela gripe, para se certificar de que, apesar se sentir só, não é o único. Existe alguém auto-suficiente?Às vezes, você está rodeado de pessoas, e está só. Pode estar só no meio da multidão. Pode estar só no seu casamento, com os seus filhos. Até as desejadas por todos podem estar só. Marylin Monroe esteve só. Como Sylvia Plath. Como Virginia Woolf. Como Cyclone. Quem?Maria de Lourdes Castro Pontes, a Cyclone, uma estudante de 18 anos, amante de Oswald de Andrade. Sua história é contada na peça O Perfeito Cozinheiro das Almas Deste Mundo, de Jefferson Miranda (com Luiza Mariani no papel), no Sesc Paulista, baseada num diário coletivo escrito por Oswald e amigos, na garçonnière que mantinham no centro da cidade, antes da Semana Moderna de 22, em que tinham relações com a menina de 18 anos, amada por muitos, porém muito só. A solidão de Cyclone era a mais aguda, pois sabia que vivia num momento da história que não era o seu. Nasceu há quase um século antes do tempo.Pronto, indiquei alguns programas para você, solitário. Mexa-se. Fonte: O Estado de S. Paulo, 8 de junho de 2007

domingo, 10 de junho de 2007


Faz de conta que tem sol lá fora"
Assisti emocionado à estréia de Aline Meyer na direção, na sexta. Era o meu texto, "Faz de conta que tem sol lá fora". Foi a terceira encenação deste texto que eu assisti. Seguramente a melhor. Tudo ali funciona.Jerusa Franco e Niltinho Bicudo dão um show.O cenário de Cássio Amarante é deslumbrante;os figurinos e caracterização do Leopoldo Pacheco são perfeitos.E o que é aquela 'música triste' do Rubi?Aline se joga na direção com pé direito.Consegue realizar um puta trabalho e eu estou orgulhoso.Acho que vale a pena dar uma olhadela no que eles conseguiram."Faz de conta que tem sol lá fora" fica em cena até o final do mês.Sempre as sextas e sábados à meia-noite.

Delicadeza e dorpor Alberto Guzik - Os Dias e as Horas
Nessa madrugada, à meia-noite, quando começava um dia bastante particular para mim, tive a chance de torná-lo mais particular e significante. Fui ver “Faz de Conta que tem Sol lá Fora”, de Ivam Cabral, em montagem dirigida pela batuta Aline Meyer. Não haveria meio melhor de começar este novo ciclo de minha vida. O espetáculo, interpretado por Jerusa Franco e Nilton Bicudo, é uma pequena obra-prima. Estava exausto, por conta da sessão de bufão com a Roberta, anteontem, e da tormenta que desabou sobre nossas cabeças ontem. Mas lutei contra o cansaço para me deixar envolver por essa história pequena e arrebatadora, pungente de solidão. Aline Meyer no programa aproxima o texto de Ivam das peças curtas de Tennessee Williams, e com toda razão. A linguagem, os diálogos, para quem conhece nosso artista, é puro Ivam Cabral. Mas o clima, o ambiente, a situação, poderia fácil fazer par com “27 Vagões Cheios de Algodão” ou alguma daquelas outras pecinhas primorosas de Williams. E a montagem de Aline Meyer é de uma suavidade exata e cortante. Sem nunca incorrer na piedade pelas personagens, expõe sua solidão com delicadeza e ternura. A cenografia de Cássio Amarante é certeira: uma jaula de cortinas de renda. Lá dentro, um tapetinho branco, duas poltroninhas e um móvel com um fogareiro eternamente aceso sob uma chaleira e um aparelho de som. Os figurinos e a caracterização, assinadas por Leopoldo Pacheco, também são excelentes. E as atuações de Nilton Bicudo, um ator sempre expansivo, em um papel contido, de uma timidez quase doentia, e de Jerusa Franco como a garota expectante, mas presa a dezenas de condicionamentos e travas, são emocionantes, arrepiam pelos abismos de emoção que escondem sob uma superfície polida. Muita gente do meu lado na platéia saiu da sala enxugando os olhos. Eu não chorei. Mas estava encantado. Depois da noite difícil um início de madrugada sublime. Não poderia ter ganho um melhor presente. Que bom!

Maria Lúcia Candeias, especial para o Aplauso Brasil (mlcandeias@aplausobrasil.com)
SÃO PAULO - Acabou de estrear no Espaço dos Satyros 1, "Faz de Conta que Tem Sol Lá Fora", texto do ator Ivam Cabral que mostra um casal de tímidos, com muita delicadeza e romantismo, talvez no horário errado: sextas, a meia noite. Os boêmios certamente vão discordar. De todo modo, na cena, um casal com atração mútua visível assim como um pouco tímidos.
A atuação de Jerusa Franco e Nilton Bicudo é um verdadeiro show. Quem costuma ir ao teatro para ver bons atores não pode perder. O cenário de Cássio Amarante, bonito e eficiente, os figurinos adequados de Leopoldo Pacheco a iluminação de Kátia Coelho também excelentes, tudo pelas mãos da diretora Aline Meyer. Como se pode concluir, quem vai ao teatro para reparar em tudo, também vai gostar.
Já faz um tempinho que "Eu te Darei o Céu" re-estreou na sala principal do Teatro Augusta. É uma ótima comédia em que uma mulher tímida contracena com um garoto de programa. A platéia se diverte bastante. Além disso, os atores são excelentes. NanNy de Lima dá um show e Mateus Rocha não fica atrás. Vale destacar a excelente direção de Luiz Antonio Rocha que adaptou o cenário ao pequeno palco do Augusta, usando cortinas pretas e ao fundo o trânsito da própria cidade. Como se fosse a janela do apartamento da personagem. É ótimo. Não perca, às quartas e quintas, sendo essa semana, a última. São duas peças singelas mas que valem ver.
VEJA ENDEREÇOS E HORÁRIOS EM http://www.guiaoff.com.br/